indios de reservas ambientais de Amarante |
AMARANTE DO MARANHÃO (MA) - O Maranhão
abriga um cenário desolador na Amazônia Legal. O estado, que desmatou 71,28% de
sua floresta original, pondo abaixo 105.195 km² de árvores, tem pelo menos 13
municípios vivendo de eliminar o que deveriam preservar. Pior, boa parte da
mata que está sendo devastada ou é explorada ilegalmente tem dono: os índios.
As terras indígenas, que por lei são de proteção integral, equivalem a 52% dos
42.390 km² de floresta ainda restantes no estado. O Maranhão tem 17 terras
indígenas, onde vivem 26.062 índios, segundo o Censo de 2010. Dados do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que 13% das áreas
indígenas no estado foram desmatados.
Amarante do Maranhão é uma espécie de símbolo dessa destruição. À margem das
terras indígenas Governador e Arariboia, o município se acostumou a viver
principalmente dos bens da floresta. Já fez riqueza com a exploração do
jaborandi, espécie vegetal disponível apenas no Brasil. É famosa na cidade a
história de “Nonato da Folha”, que enriqueceu como atravessador na venda de
folhas de jaborandi, daí o sobrenome. Um dos livros da série “Aconteceu, povos
indígenas do Brasil”, publicada pelo Centro Ecumênico de Documentação e
Informação (Cedi) na década de 80, relata que, por mais de 13 anos, as folhas
dessas árvores foram retiradas e destinadas a um laboratório alemão, que
extraía dela a pilocarpina, um vasodilatador natural usado na fabricação de
colírios.
Ainda hoje, índios mais velhos da terra
indígena Arariboia lembram que não só folhas eram arrancadas, mas árvores
inteiras iam abaixo, para que a extração fosse acelerada. Da quantia paga aos
índios ao valor de embarque nos navios, o preço aumentava pelo menos oito
vezes. Depois, houve o apogeu da extração de madeira e o interesse por outras
substâncias, entre elas o óleo de copaíba, poderoso antibiótico da mata, usado
em remédios anti-inflamatórios.
Sede de dezenas de serrarias e de
fábricas de móveis, portas e janelas em madeira natural, Amarante do Maranhão
viu a floresta acabar fora da área indígena e avançou sobre a reserva,
cooptando índios em troca de R$ 50 ou R$ 100 por caminhão — cada um levando
quase uma dezena de toras por vez. No início deste ano, líderes dos índios
gaviões, da terra indígena Governador, decidiram dar um basta à invasão e
apreenderam quatro veículos carregados. Inconformados, moradores formaram uma
barricada de fogo na cidade, na tentativa de impedir que a Polícia Federal
levasse os caminhões e as toras apreendidas. Mesmo sob ameaça da fiscalização,
seis serrarias funcionam no município.
— Aqui agora só circula dinheiro de
aposentado, do Bolsa Família e de funcionários da prefeitura. O setor de
madeira está em crise — conta desolado um comerciante da cidade, que não quer
se identificar.
A outra atividade econômica relevante
em Amarante do Maranhão é a criação de gado, que pouco emprego gera no
município de 37 mil habitantes. Só dois peões dão conta de um rebanho de mil
bois.
Segundo o Ministério Público Federal no
Maranhão, a situação não difere muito nos demais municípios da lista, todos
vizinhos ou muito próximos a terras indígenas: Centro do Guilherme, Itinga do
Maranhão, Grajaú, Barra do Corda, Jenipapo dos Vieiras, Buriticupu, Arame, Bom
Jesus das Selvas, Centro Novo do Maranhão, Zé Doca e Santa Inês.
A diferença está no nível de degradação
da floresta. Enquanto a mata de maior valor já foi abaixo em Amarante do
Maranhão, na região mais ao Norte do estado, próxima à terra indígena Alto
Turiaçu, onde fica a maior área contígua de floresta do estado, ainda prospera
a venda de madeira mais nobre, com corte seletivo e rentabilidade mais alta.
Propina para
liberar a entrada de caminhões
Mesmo tendo destruído a maior parte de
sua mata nativa, a extração de madeira em toras no Maranhão segue expressiva. A
pesquisa Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura do IBGE, mostra que, em
2011, o Maranhão produziu 174.073 metros cúbicos, dos quais 26% saíram
justamente dos 13 municípios vizinhos às terras indígenas.
Grajaú foi o maior produtor de carvão
em 2011. No ranking dos 20 maiores produtores do país estão Barra do Corda e
Centro Novo do Maranhão. O problema é que parte da madeira que vira carvão sai
das áreas protegidas. Basta percorrer as terras indígenas para ver dezenas de
ramificações de estradas abertas por madeireiros.
A situação de descalabro é tão grave
que o ex-prefeito de Maranhãozinho foi indiciado pela Polícia Federal em
dezembro passado. Josimar Cunha Rodrigues foi acusado de cobrar R$ 150 por
caminhão para liberar a entrada nas áreas indígenas. Pela barreira montada pela
prefeitura só passavam caminhões cadastrados e com tíquete de pagamento da
propina.
— Fiscalizar é como enxugar gelo. Se o
Estado não oferece alternativas de sobrevivência aos municípios, é difícil sair
do cenário de desmatamento. E a situação tende a se agravar, pois a população
dessas áreas aumenta e as políticas públicas não chegam. — avalia Thaís Dias
Gonçalves, coordenadora geral de monitoramento territorial da Funai.
Meu amigo, da floresta amazônica com certeza não vai mais sobrar nada.
ResponderExcluirHumberto de Cariri
Reportagem muito boa!
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