Zeca Camargo é um jornalista cultural de primeira linha.
Passou
por grandes órgãos, foi editor da Capricho, Ilustrada, passou pela TV Cultura,
esteve no começo da MTV e foi para a Rede Globo.
Entende
de músicas como poucos. Seu blog no G1 é referência, denso, robusto e preciso.
Sua
presença no Fantástico, como no quadro Medida Certa, era um desperdício.
Merecia mais.
Não
emplacou como apresentador do Vídeo Show.
Mas
emplacou uma “coluna” sensacional no JORNAL DAS DEZ, da Globo News, que deu no
que falar e foi insanamente atacada dentro e fora da emissora.
O lide
era a morte do cantor sertanejo Cristiano “Ronaldo” Araújo e sua espantosa
repercussão, cantor conhecido pelo “grande público” e desconhecido pela “elite
cultural”.
Na sua
vídeo-crônica, Zeca não desqualificou o cantor ou seu público, muito menos
desdenhou a tragédia. Mas virou o vilão da semana, num debate regido pela
emoção, intolerância, preconceito e leitura torta.
E teve
que vir a público se desculpar na emissora, retratação em que cometeu deslizes,
gaguejou e “talvez” se explicou que “talvez” tenha sido mal-entendido.
Foi
nada. O que ele disse na crônica faz todo o sentido.
Falou
da surpresa da comoção nacional, do “evento triste”, e citou a enormidade do
País, a diversidade cultural e o “talento” natural para a música.
O
“abraço coletivo” em torno da dor simbolizaria uma catarse coletiva, como se
todos nós estivéssemos atrás de uma união pela emoção, para expurgar nossas
dores.
Como se
o choro tivesse uma capacidade purificadora.
Então
veio o que incomodou fãs, mercado, a TV aberta, a indústria e seu empregador.
Como
nos deixamos seduzir pela morte de um artista relativamente desconhecido?
“A
resposta está nos livros de colorir”, atestou Zeca.
Segundo
ele, a nova moda “literária”, acusada de representar a pobreza da atual alma
brasileira, é a vilã do cenário pop e mostra um vazio cultural no país de
Machado, Lima Barreto, Modernistas, Guimarães Rosa, Graciliano Ramos, Nelson
Rodrigues e Noel Rosa, Tom Jobim, Tropicália, Jovem Guarda, Clube da Esquina,
Renato Russo, Cazuza, Mangue Beat e Chico Sciense.
A
comoção pela morte do cantor estaria ligada à ausência de “fortes referências
culturais que experimentamos”.
A
“INSANA” cobertura de sua despedida vestiu a carapuça do vazio de figuras
esperando a tinta e significado, “só esperando a tinta da emoção”.
Como
“robôs coloristas”, preenchemos desenhos na ilusão de estarmos criando alguma
coisa, afirmou.
Para
quem começou a trabalhar quando Legião Urbana, Titãs, Cazuza e Plebe Rude
dividiam o palco de programas de auditório da TV aberta com Raul Seixas, Gil e
Caetano, Mutantes, Milton Nascimento e Elis Regina, a monotonia da nossa
música, que já dura algumas décadas, esvazia o mercado, dá poucas oportunidades
a outros estilos e à renovação.
Zeca
disse o que está entalado na garganta dos fãs da boa música:
“Nossa
canção popular é dominada por uma música só. O nosso pop não precisa ser assim…
Não precisa ser assim, precisamos de novos heróis, mas está todo mundo ocupado
pintando Jardins Secretos [obra que começou a onda de livros
para colorir]”.
Alguém discorda?
Não sei
se Zeca será retaliado ou irá para a geladeira. Seria uma burrice da emissora
encostá-lo, não apoiá-lo. Deveria sim ter mais colunas na Globo News.
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