Miguel Torres*
Folha de São Paulo
Força Sindical teme que o projeto de
lei antimanifestação do governo federal, se aprovado, vire a segunda versão do
AI-5, o ato institucional que endureceu o regime militar, em dezembro de 1968.
Naquele
período, primeiro foram proibidas as livres manifestações. Depois, os jornais e
emissoras de televisão foram censurados. Mas foi justamente o povo nas ruas que
conquistou a redemocratização. Parece que o governo se esqueceu desse capítulo
da história.
O
ministro da Justiça, atropelado pela pressa, pode cair no terreno da
intolerância. Será que ele não se recorda da importância das Diretas Já em São
Paulo e no Rio de Janeiro?
A
Força Sindical teve acesso à íntegra do projeto, chamado por alguns de lei
antiterrorismo. Considera-o uma mordaça com viés autoritário aos movimentos
sociais cujo intuito é inibir, senão calar as livres e legítimas manifestações
de rua.
Como
o do governo, há quase dez projetos similares no Congresso.
Representantes
da Força Sindical reuniram-se recentemente com os presidentes da Câmara dos
Deputados e do Senado Federal para expressar a preocupação da classe
trabalhadora com o tópico.
Ambos
os líderes se mostraram sensíveis ao tema e temerosos, como os sindicalistas,
pela ameaça de supressão dos direitos sociais.
Se
confirmado o texto, não restará dúvida de que o projeto de lei do governo nada
mais é do que uma tentativa de reprimir as demandas da população.
Aproveitando-se do momento de turbulência e excessos praticados por pequenos
grupos como os "black blocs", ele visaria criminalizar os
protestantes.
Já
contamos 50 anos desde o golpe de 1964 e 25 anos desde a promulgação da
Constituição cidadã. O bom senso pede que mudanças sejam debatidas com
racionalidade, baseadas no princípio da razoabilidade. O governo precisa
entender que manifestante é manifestante e terrorista é terrorista.
Esse
mesmo projeto, se mantido com o vimos, chegaria ao absurdo de propor a redução
de três para duas pessoas reunidas para que seja caracterizada, perante o
Código Penal, formação de quadrilha.
Quer
dizer que dois sindicalistas propondo uma greve na porta de fábrica por atrasos
nos salários serão, com eventual aprovação do projeto do governo, presos e
enquadrados no artigo de formação de quadrilha?
Interessante
que o Palácio do Planalto faça alarde por meio de propaganda institucional do
aumento da renda da população nos últimos anos, como se fosse mérito
governamental, mas se esqueça que os reajustes salariais são conquistas dos
sindicatos.
E
os sindicatos, por sua vez, utilizaram atos, manifestações e greves como forma
de organização e pressão para obter tais resultados. Sim, porque é inequívoco
que foram as nossas manifestações que ajudaram a melhorar a distribuição de
renda no país.
Atos
de vandalismos são inaceitáveis. Mas precisamos estar vacinados contra as
tentações autoritárias. A Força Sindical defende manifestações de rosto limpo,
como faz há 22 anos. Afinal, todos os trabalhadores e militantes estão nas ruas
porque acreditam na luta e nas bandeiras que empunham. Não precisam resguardar
suas identidades.
Mas
não abrem mão de seu direito de manifestar-se livremente.
*MIGUEL TORRES,
55, é presidente da Força Sindical e do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo
e Mogi
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